segunda-feira, fevereiro 26, 2007
realidade*: A boa vontade podia estar na moda para tudo
Quem dizia que não tinha nada para fazer na cidade de Guarulhos agora diz que não faz nada por falta de lugar. As filas quilométricas são impressionantemente divididas por pessoas de todas idades e posições sociais.
Seja por curiosidade ou por gosto, o fato é que o teatro lota a cada evento e mostra que a prefeitura acertou no investimento pesado em cultura. E mesmo que não passe de um artifício arrecadador de votos para o ano que vem - diriam aquelas figuras agradabilíssimas que preferem torcer contra que apresentar soluções melhores - os beneficiários estão sabendo se aproveitar muito bem da situação.
Não é difícil lembrar-se das noites em que voltávamos após ter tocado para, num dia bom, um publico de 20 pessoas num teatro pequeno de biblioteca. Passados 4 ou 5 anos vemos que a simples construção de um centro educacional motivou espectadores ou meros curiosos a saírem de suas casas para esquecer um pouco da realidade divertindo-se com uma apresentação musical ou uma peça de teatro, que nem precisam ter o peso de uma obra de Shakspeare.
Pensando nisso, imagine o que faria um pequeno incentivo como este para motivação de interesse político, para motivar o interesse às questões ambientais, a simples instalação de latas de lixo reciclável em vários pontos acessíveis da cidade.
Tomara que este empenho empregado na cultura prossiga por parte de todos e que contagie os responsáveis por outros setores, como os de assuntos urbanos, que deixam a desejar fechando os olhos para tantas construções abandonadas, falta de iluminação em ruas e praças e falta de cuidado com o patrimônio e limpeza.
causo*: O dia em que a cidade foi ao teatro
1,2 milhão de habitantes
1 teatro bastante importante
1 produção de porte considerável
1400 ingressos
2 dias de espetáculo
700 lugares
1400 pessoas que correram para garantirem sua cadeira
2 dias de vendas de ingressos
15 minutos dividiram-me entre ter e não ter um ingresso
Dados estes números, alguém sabe me dizer qual a probabilidade de um passado longínquo, com a esposa, sentar-se ao seu lado para ver a peça? Certamente uma conta bastante complexa... Um fato bastante improvável... Mas a questão crucial é: O passado de quem? E eu digo: de quem vos escreve.
Muito bem! Agora sim a resposta está mais que dada: 100% é claro!
Mas vejam só... tenho certeza que só não ganhei na loteria ainda porque nunca joguei.
Acaso? Só se esta palavra significar fato que tinha que acontecer para lhe causar reação necessária, neste caso, nas condições atuais, faltava-me o frescor da ironia da vida!
E ainda acham que é à toa que dou tanto valor às mesmices cansativas de uma vida com tantos pequenos e bizarros acontecimentos cotidianos.
post extra*: a situação mereceu um registro
domingo, fevereiro 18, 2007
realidade*: O futuro? Boa pergunta.
Basta pressionar um botão e pronto, põe-se a sua disposição qualquer coisa que desejar ver. Imagens que condizem com seu estado de espírito no momento, informações sobre assuntos dos quais não extrapolam seus interesses e a liberdade mais limitada que se pode conhecer posta a seu comando. Eis aí a nova discussão acerca do impulso tecnológico dado aos meios de comunicação.
Antes que alguém pense em querer me julgar reacionária, tentarei explicar minha preocupação com este desenfreado avanço.
Tomemos como primeiro exemplo o caso do YouTube, o protagonista de polêmicas recentes e de conseqüências inicialmente palpáveis. Depois de vermos o fracasso de uma tentativa de censura judicial e nos posicionarmos ideologicamente a respeito do que é de fato a tão almejada privacidade, não nos restam duvidas de quão incontrolável pode ser uma ferramenta de acesso livre (tanto na reprodução quanto na criação) a ponto de ser capaz de influenciar o questionamento da opinião publica.
Outro exemplo, que ainda está por vir, apresenta uma face, de certa forma, oposta a anterior, é o da tv digital. Neste caso, teremos também um pacote de informações inteiro a disposição de nossas vontades momentâneas, diferindo-se pela fonte criadora de conteúdo, as empresas de telecomunicação.
Isto posto, volto a minha reflexão inicial: será que estamos preparados para uma manipulação ponderada de tantos assuntos, uma vez que a escolha será sempre por aquilo que nos agrada, fazendo nossos parâmetros de qualidade virarem especialistas nisso ou naquilo que preferimos assistir? Ou, por outro lado, será que o privilégio de escolha mostrar-se-á legítimo tendo em vista o monte de porcaria que a tv aberta nos oferece a atacado?
Pois bem, e numa conclusão delirante de minha parte, penso que justamente aquele tal de YouTube, disposto a receber e transmitir o que o publico deseja como consumo, pode ser a chave para uma demonstração do que realmente nos interessa: diversão (é claro, e a principio a principal utilidade do site), informação (como já anda sendo colocado timidamente através de sites similares com programas educacionais e filmes documentários) e, porque não, alcançando o ápice da falta de desperdício de inteligência humana, sendo utilizado como ferramenta de utilidade publica (exibindo, por exemplo, vídeos como este que nos abre os olhos para percebermos a que ponto chega a palhaçada da política nacional).
vídeo*: já faz algumas semanas que isso aconteceu, mas senti necessidade de colocar isso aqui mesmo assim
enquanto isso no carnaval*: é, mais um carnaval de sofá. Tudo bem, quem sabe ano que vem vou para Recife dançar um frevo... A propósito, lindo desfile da Viradouro.
sexta-feira, fevereiro 16, 2007
realidade*: Aquele colorido que eu não conhecia
"HINO DOS BATUTAS DE SÃO JOSÉ
Eu quero entrar na folia meu bem
Você sabe lá que é isso
Batutas de São José
Isto é parece que tem feitiço
Batutas tem atração que
Ninguém pode resistir
Um frevo deste bem faz
Demais a gente se distinguir
Deixa o frevo rolar
Eu só quero saber
Se você vai ficar
Ai meu bem sem você
Não há carnaval
Vamos cair no passo
E a vida gozar"
[João Santiago]
Não passava de mais uma classificação entre tantas na música nacional que se diferenciava por fazer pessoas dançarem com sombrinhas coloridas. Agora vai além de mais uma fração da diversidade.
No meu caderno de rascunhos estão anotados outros temas e textos que falam de momentos de agora [que confesso estou relutante em colocar aqui temendo a redundância, embora o efeito da redundância possa ser a motivação para a transcrição dos textos], mas por ora eles darão licença a mais uma das novas 'descobertas' feita em momento bastante oportuno.
Mais uma quarta-feira de Jazz Sinfônica. Sim! Eu consegui ir ver Spok! E graças à voz do bom senso, às duas da tarde a bilheteria abriu para nos servir do conforto da certeza de uma cadeira numerada.
Desta vez não havia ninguém reclamando de demora para a abertura dos portões do auditório, só o que ouvi foi o deslumbramento ao final do concerto, de pessoas, que como eu, só ouviram frevo pela tv até então.
Felizmente tem coisas que só sabe quem vive, quem vê ou quem ouve. Simplesmente não há como descrever o que ouvi aquela noite. O máximo que posso dizer é que com certeza foi uma das apresentações de orquestra mais belas que já tive oportunidade de presenciar.
Coloquei uma pequena amostra do que ouvi para que você possa tirar sua própria conclusão e despertar por si a vontade de ampliar seu repertório musical.
pois é*: toda essa história me fez lembrar que ainda existe carnaval e que talvez este seja mais um ano em que passarei sentada no sofá. Um tanto quanto triste, já que mesmo meus míseros 20 anos têm saudades dos carnavais do Rio e dos blocos de rua do interior de alguns anos atrás. Quem sabe ano que vem, pelo menos o Anhembi veja minha cara de perto.
quem é o Spok?*: um dos melhores saxofonistas que conheço.
link*: Spok frevo orquestra
segunda-feira, fevereiro 12, 2007
personagem*: A mulher risonha
Inauguro a descrição de ilustres personagens do cotidiano com um tipo bem conhecido de quem costuma ir ao teatro. A senhora risonha.
Não sei é obra da famosa ironia do destino, se faz parte do espetáculo ou se é uma pegadinha de televisão, mas ocorre que é tão constante a presença de tal indivíduo, que se começa até a duvidar do acaso que rege a compra de ingressos de cadeiras numeradas.
Infelizmente não se trata de uma caricatura percebida a primeira vista e sim a primeira piada, o que faz com que o tempo que você possui para trocar de lugar, como faz no cinema ao tratar logo de ficar longe de grupos possivelmente barulhentos, inexista.
Para ela não há meio termo, ou a piada é engraçadíssima, ou a piada é engraçadíssima. O simples fato de a luz da platéia apagar já pode ser um fato hilário.
Bom, tudo bem se a pessoa é tão feliz a ponto de fazer com que você fique na dúvida se ri dela ou do ator, mas o real problema encontra-se no exato instante em que se percebe que aquela simpática e sorridente senhora, além de ser extremamente feliz por natureza, já tenha visto o espetáculo antes. O forte indício: ela conta o fim da piada antes que ela seja dita por aquele de você espera o fim da piada ser contado.Pois bem, diante desta situação praticamente não há o que fazer. Apenas pensar em algum lado bom provável...Quem sabe ela não está lá justamente para garantir sua alegria no caso de a peça ser um fracasso?
peça em questão*: "Recital de humor", de Sérgio Rabello [bom]
imagem*: ela era mais ou menos assim
quarta-feira, fevereiro 07, 2007
delírio*: Mundo real
O preço do feijão
não cabe no poema. O preço
do arroz
não cabe no poema.
Não cabem no poema o gás
a luz o telefone
a sonegação
do leite
da carne
do açúcar
do pão.
O funcionário público
não cabe no poema
com seu salário de fome
sua vida fechada
em arquivos.
Como não cabe no poema
o operário
que esmerila seu dia de aço
e carvão
nas oficinas escuras
– porque o poema, senhores,
está fechado: “não há vagas”
Só cabe no poema
o homem sem estômago
a mulher de nuvens
a fruta sem preço
O poema, senhores,
não fede
nem cheira."
[ferreira gullar]
Nesta versão aparentemente nada sensível, digo que não encontrei forma melhor de demonstrar meu amor pela poesia e pela beleza da realidade! Sim! Para quem não sabe, existe beleza no mundo real!
Dedico este post a meus queridos amigos que não gostam de poesia, mas que tenho certeza que gostarão desta!
vídeo*: mais poesia contemporânea da boa? Veja essa de Ricardo Domeneck
imagem*: qualquer coisa que desenhei hoje
segunda-feira, fevereiro 05, 2007
realidade*: Educação? O grande objetivo era alcançar a meta.
Neste sábado (03-02), surpreendi-me com um artigo em um noticiário de tv dizendo do corte de mais 50% de escolas estaduais inseridas nas atividades do “Escola da Família”. Depois de três anos de existência de atividades extra-curriculares gratuitas oferecidas a comunidades carentes, as circunstâncias fizeram muitas crianças e jovens voltarem para suas casas ao encontrarem suas escolas fechadas.
Para completar o absurdo, já iniciado com o anúncio da redução pela metade da verba destinada a tal fim pelo governador José Serra, o Governo mudou de desculpa alegando que sua parte na história estava praticamente concluída, visto que a violência nos locais em que o programa era executado havia diminuído cerca de 60%, e, portanto, as comunidades já haviam absorvido o ideal do ato de ‘generosidade’ governamental. Outro argumento cabe ao direito que os diretores dessas escolas possuem de abrir as portas de seus colégios aos fins de semana, mesmo sem a vigência do programa.
Agora vamos aos fatos, digamos que esses diretores resolvam abrir suas portas para continuar a oferecer os cursos que já estavam em andamento:
- Deve haver uma reorganização de equipes de voluntários para a continuidade dos cursos, já que os que estavam trabalhando nas escolas que foram excluídas do direito serão remanejados [pois a maioria depende de bolsas do governo para concluir seus estudos] para as instituições ainda privilegiadas;
- Deve-se prosseguir com a manutenção das compras de materiais eventualmente necessários para as aulas, mas de onde viria o dinheiro? Dos alunos que não tem nem como pagar a passagem? Dos diretores, professores ou voluntários das escolas? Da iniciativa privada sabe-se lá de que empresas?
Podemos dizer então, que todas aquelas crianças e jovens que voltaram para suas casas no sábado de manhã estão simplesmente entregues a boa vontade das escolas e da própria comunidade. Não digo que esta boa vontade não exista, principalmente por parte da comunidade, porém, por experiência própria, posso dizer que não são todas as escolas [e nem tão pouco todos os profissionais de educação da rede pública] que estão dispostas a fazer algo além de sua obrigação semanal de forma espontânea.
Sinceramente não consigo entender a lógica desta medida! Também gostaria muito de saber para onde vai este dinheiro que deixará de ser investido. Será investido em mais empregos para os pais desses jovens conseguirem proporcionar lazer pago a seus filhos, ou na melhoria de infra-estrutura e ensino de escolas estaduais? Será investidos no incentivo à cultura, ou na construção de centros esportivos e de artes em comunidades pobres? Ah não, claro, como não havia pensado nisso antes: será sabiamente investidos na construção de uma nova e exemplar Febem.
artigos*: “Serra reduz o Escola da Família” – O Estado de S.Paulo
“Escola da Família está sendo reduzido” – SPTV
sexta-feira, fevereiro 02, 2007
surrealidade+realidade*: Dois de fevereiro
"Para Iemanjá
Oferenda não é essa perna de sofá. Essa marca de pneu. Esse óleo, esse breu. Peixes entulhados, assassinados. Minha Rainha.
Não são oferenda essas latas e caixas. Esses restos de navio. Baleias encalhadas. Pingüins tupiniquins, mortos e afins. Minha Rainha.
Não fui eu quem lançou ao mar essas garrafas de Coca. Essas flores de bosta. Não mijei na tua praia. Juro que não fui eu. Minha Rainha.
Oferenda não são os crioulos da Guiné. Os negros de Cuba. Na luta, cruzando a nado. Caçados e fisgados. Náufragos. Minha Rainha.
Não são para o teu altar essas lanchas e iates. Esses transatlânticos. Submarinos de guerra. Ilhas de Ozônio. Minha Rainha.
Oferenda não é essa maré de merda. Esse tempo doente. Deriva e degelo. Neste dia dois de fevereiro. Peço perdão. Minha Rainha.
Se a minha esperança é um grão de sal. Espuma de sabão. Nenhuma terra à vista. Neste oceano de medo. Nada. Minha Rainha.
[Marcelino Freire]"
Esta manifestação de desgosto e indignação brilhantemente exposta por Marcelino Freire [devido ao dia de Iemanjá], foi o primeiro texto que li neste dia de divulgação do relatório acerca do aquecimento global pela ONU e alerta sobre as condições do meio ambiente. Diante disso, não me atrevo a somar mais linhas. O texto fala por si e por todos nós.